Jumento brasileiro corre risco de extinção até 2030 por causa de demanda chinesa

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O jumento, animal historicamente associado ao cotidiano rural brasileiro, está prestes a desaparecer do país. Segundo a Frente Nacional de Defesa dos Jumentos, a população dessa espécie caiu drasticamente nas últimas décadas, passando de 1,37 milhão em 1996 para apenas 78 mil em 2025 — uma redução de 94%.

O principal motivo para esse colapso populacional é a crescente demanda da China por ejiao, uma substância extraída do colágeno da pele dos jumentos e amplamente utilizada na medicina tradicional chinesa, mesmo sem comprovação científica de sua eficácia.

Se o ritmo atual de abates for mantido, os jumentos podem desaparecer do território brasileiro antes de 2030, alerta o professor Pierre Barnabé Escodro, da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), em entrevista à BBC News Brasil. Escodro faz parte de um grupo de especialistas que defende a proibição definitiva do abate desses animais, com base no projeto de lei 1.973/2022 — atualmente parado no Congresso Nacional.

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Extinção global em curso

A ameaça ao jumento não é exclusividade do Brasil. Em países como Egito, a espécie praticamente desapareceu. Segundo estimativas da organização britânica The Donkey Sanctuary, cerca de 5,9 milhões de jumentos são abatidos todos os anos no mundo para atender à indústria do ejiao, que movimenta aproximadamente US$ 6,38 bilhões (R$ 35 bilhões) globalmente.

No Brasil, apenas três frigoríficos — todos localizados na Bahia — possuem autorização do Serviço de Inspeção Federal (SIF) para realizar o abate. Mesmo assim, a atividade é alvo de críticas severas pela falta de controle sanitário, ausência de rastreabilidade e denúncias de maus-tratos.

Maus-tratos e abandono

Um estudo publicado em maio de 2024 na revista científica Animals, assinado por Escodro e outros pesquisadores, analisou 104 jumentos encaminhados para o abate e revelou que todos apresentavam sinais de inflamação sistêmica — indício de abandono e sofrimento extremo.

A reportagem também destaca que os jumentos desapareceram de cidades como Amargosa (BA), onde antes faziam parte da cultura local. Com a redução drástica na oferta, os poucos animais ainda encontrados são vendidos por R$ 400 a R$ 500, enquanto suas peles chegam a custar até US$ 4 mil no mercado internacional.

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Soluções em debate

Para os defensores da causa animal, o caminho passa pela proibição do abate e pela criação de santuários, onde os jumentos possam ser protegidos e reintroduzidos em atividades sustentáveis. Experiências bem-sucedidas já acontecem em locais como Jericoacoara e Santa Quitéria, no Ceará, onde centenas de animais são acolhidos em áreas protegidas.

Além disso, pesquisadores sugerem que os jumentos podem voltar a desempenhar papéis importantes na agricultura familiar, em terapias assistidas e como força de tração animal, garantindo não só a preservação da espécie, mas também o resgate de seu valor cultural e social no país.

Com o tempo se esgotando, cresce a pressão para que o Brasil reavalie seu modelo de exploração dos jumentos. Do contrário, o país pode assistir à extinção de um animal que ajudou a construir sua história rural — abatido por um comércio global que ignora suas raízes e importância cultural.

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