A história do fim da ditadura militar no Brasil tem como uma de suas figuras centrais o mineiro Tancredo Neves, eleito presidente em 1985 por meio de votação indireta. Mas o que deveria ser o início de um novo capítulo político terminou em luto e especulações. Quarenta anos depois, médicos e aliados ainda relembram os bastidores do drama que impediu a posse de Tancredo e abalou o país.
Ao longo da campanha pelas Diretas Já, entre 1983 e 1984, Tancredo percorreu o país mesmo apresentando sintomas graves que escondia até dos mais próximos. Dores abdominais intensas e fadiga eram frequentes, mas ele se recusava a buscar tratamento. “Vitamina P, de poder”, teria dito certa vez a um jornalista que questionou sua resistência física.
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Eleito em janeiro de 1985 por um colégio eleitoral, Tancredo tornou-se o símbolo de uma transição pacífica para o regime democrático. Com apoio de amplas frentes políticas e José Sarney como vice, a expectativa era que sua posse encerrasse duas décadas de autoritarismo. Mas, na véspera da cerimônia, ele passou mal após uma missa e foi internado às pressas.
O quadro clínico se agravou rapidamente. Segundo o infectologista David Uip, que integrou a equipe médica, a situação era mais grave do que se imaginava. Um tumor benigno no intestino havia evoluído para uma infecção generalizada, afetando diversos órgãos. “Foram usadas tecnologias de ponta, antibióticos vindos do exterior, mas a condição era irreversível”, relembra.
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O neto de Tancredo, Aécio Neves, revelou que o ex-presidente resistiu à cirurgia até ser convencido de que a presidência seria assumida por Sarney com o apoio de Figueiredo — algo que, segundo ele, não era verdade, mas foi necessário para autorizar a operação.
Após uma longa batalha médica e semanas de comoção nacional, Tancredo Neves morreu no dia 21 de abril de 1985, sem nunca ter assumido oficialmente o cargo para o qual foi eleito. Sarney, então vice, tomou posse e deu continuidade ao processo de redemocratização.
Mesmo sem ter governado, Tancredo entrou para a história como o homem que simbolizou a esperança de uma nova era. “Ele representava muito mais do que um presidente. Representava a virada de um país inteiro”, define a historiadora Heloisa Starling.